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26 de junho de 2013

O gigante acordou...

Os sanguessugas foram postos contra a parede,
escondidos atrás de seus ternos, suas promessas falsas e seus sorrisos simpáticos,
protegidos por uma farda incapaz e injusta.
O povo finalmente acordou, eles disseram.
Entenderam o significado de democracia.
Entenderam que os sanguessugas de olhares bondosos e palavras dóceis
também mordem. E já vêm mordendo o povo a bastante tempo.
Então está tudo propenso. 
Um governo insuficiente, um evento desnecessário, mudanças absurdas, um povo revoltado e uma força de contensão injusta e incapaz.
Várias cidades, diversos estados, um mesmo país.
Diversas frase, um mesmo grito, um clamor por mudanças.
Queremos um novo Brasil.
"O gigante acordou", eles entoaram.
E de fato foi lindo estar na rua,
ouvir todas aquelas vozes se juntando numa só,
chamando, gritando e batendo no peito o orgulho de ser brasileiro.
Orgulho de pertencer à uma terra quebrada, uma terra de promessas não cumpridas,
uma terra de falhas encobertas por maquiagem. Uma terra de hipocrisia.
"O gigante acordou", eles entoaram.
Mas será mesmo?
O povo percebeu que usar a voz é a melhor coisa que pode fazer.
Gritar, fazer acontecer, chamar atenção do mundo para um Brasil que não é disfarçado com bunda, samba e futebol.
Aliás, que futebol? Estamos mesmo numa copa? Não me recordo de notícias sobre isso...
Sim, o povo acordou. Ou boa parte dele sim.
Como podemos entoar "o gigante acordou", se ainda existe aquele que acha que é por 20 centavos?
Com que pensamento você vai às ruas, clamar seus direitos? Se for de forma protestante, pacífica e orgulhosa por tudo o que você está fazendo pelo país, continuo a te aplaudir e piscar a luz sempre que você gritar...
Mas será mesmo que o gigante acordou?
O país abriu os olhos pro que falta: educação, saúde e condições de vida.
Pois eu atento pra outras coisas também importantes que muitas vezes são suprimidas não pelos sanguessugas que tanto nos morderam, mas sim pelo povo que grita, que pinta a cara e que vai à rua.
Será que alguém lembrou do respeito, do bom senso e do pensamento livre?
Sim!
Respeito é uma das coisas que mais falta no Brasil. "Ora, pra isso reivindicamos boa educação!". Como uma sociedade que não respeita o outro, que julga tudo e todos, que exclui o minoritário e não acolhe nada que fuja dos padrões aceitáveis para si próprio pode ser digna de uma boa educação?
Por favor, não modifique meu discurso. Apoio toda a manifestação pacífica, que grita e pede mudanças. Mas o que eu venho perguntar é: já que estamos pedindo mudanças exteriores, por que não começar provendo mudanças interiores?
Bom senso se mostrou mais do que aceitável nessa situação de protestos. Ora, cadê bom senso em ir à manifestações para beber? Ir para gritar e entoar um hino, para logo em seguida destruir o que já é, precariamente, nosso? Cadê bom senso de julgar o que é certo e o que é errado...? Cadê bom senso em abrir os olhos sobre as mídias manipuladoras que mudaram o discurso sobre as manifestações e que de uma hora pra outra só falavam disso? 
Não tinha uma copa rolando? Vish, não me lembro...
Ao mesmo tempo em que a revolta chega, ela parece se tornar cada vez mais perdida.
Enquanto muitos querem gritar, outros só se importam com fotos em rede social.
Enquanto alguns piscam a luz em apoio, outros se escondem e nos chamam de vagabundos.
Enquanto uns fecham ruas e mudam o país, outros reclamam de como demoraram para chegar em casa.
Enquanto alguns levam spray de pimenta na cara, outros defendem a farda corrupta que "protege".
Farda essa que a tempos atrás estava do nosso lado da luta, gritando por direitos, querendo mais, não se contentando com o que tinha. E agora atacava de forma desnecessariamente agressiva aos que fazem o mesmo.
Enquanto alguns viam na TV que manifestantes começavam tumultos, outros sabiam da verdade pela internet. A tecnologia do futuro, onde a informação é passada tão rápido que quando você pisca, já chegou uma nova. 
Quem é que ganhou a copa mesmo? Como assim ainda tá rolando?
Enquanto alguns focavam em manifestações, outros fecharam os olhos pro que acontecia em volta.
Enquanto todos estavam à rua, o Presidente da Comissão de Direitos Humanos se achou no direito de aprovar uma nova doença.
E de repente, todos sofrem com essa doença... mas ninguém quer a cura.
O Brasil ainda está na copa? Teve gol do Neymar...?
Cura eu quero é pra incompetência do governo.
Cura eu quero é pras asneiras que muitos falam sem ter base ou fundamentos para tal.
Cura eu quero pras pessoas de mente pequena que não aceitam as diferenças e apoiam a tal cura.
Cura eu quero pros que acham certo um país rico em cultura de qualidade, ser conhecido como o país da bunda ou o do futebol.
Cura eu quero pra religião fervorosa que parece, infelizmente, alienar as pessoas cada vez mais. Talvez mais do que as tais mídias manipuladoras.
Cura eu quero pra todos aqueles que sofreram danos físicos enquanto lutavam por um novo Brasil.
Cura eu quero pro pensamento mesquinho de quem realmente acreditou que era por 20 centavos.
Mas, acima de tudo, o que eu quero mesmo é liberdade. 
Um país justo, onde cada um é livre pra pensar e agir como bem entende. 
Um país onde uma repórter, exercendo seu trabalho, não tome um tiro no olho.
Um país onde, mesmo que você não apoie as diferenças, você consiga respeitá-las.
Talvez isso seja mais utópico do que abrir mão do entretenimento maquiado pelas mudanças necessárias...

11 de junho de 2013

coragem

em diversos momentos da sua vida tudo o que você vai precisar é coragem...
coragem para não olhar pra trás e seguir em frente, tentando não se arrepender do que passou.
coragem pra mudar e ser diferentes; menos dependente dos outros, tornando a autossuficiência uma prioridade; sem se importar em se entregar, mas também sem fazer esperando algo em troca; ser bastante para si e para os outros.
coragem para poder dar um salto mais alto, pensar mais à frente, decidir sem se auto julgar.
coragem para arriscar; se deixar levar pelo desejo momentâneo que vêm num surto de adrenalina; pensar nas consequências negativas só depois; se arrepender por ter feito e não por ter pensado.
coragem para eternizar um momento caso ele seja bom; jogar todos os outros ruins fora, sem se importar se machuca... a você ou a outros.
coragem para bater o pé na sua decisão; bater de frente.
coragem para cuspir palavras amargas; não se importar com julgamentos e olhares tortos.
coragem para ligar o botão do foda-se e tentar ser feliz, com ou sem alguém... o importante é você. 
coragem para ser o centro do seu mundo; sem colocar ninguém em pedestal; dar mais atenção à si mesmo. 
coragem para desabafar... nem que seja para você mesmo; admitir todos os seus defeitos, erros e medos.
coragem para escrever, pensar e ousar sobre o que bem entender.
coragem para desafiar seu instinto de segurança.
coragem para pecar; ser sujo, mal, ambicioso.
coragem... que muitas vezes já me fez falta.
e, aliás, continua fazendo.
uma última nota, então, seria: coragem .... para ter coragem.

5 de junho de 2013

O Preço da Liberdade

"           Depois da morte de sua mãe, Bruna se viu perdida no mundo. Com apenas 9 anos e sem nenhum parente de sangue para ampará-la, se viu desolada e totalmente sem chão. A partir daquele dia ela seria obrigada a morar sozinha com Carlos, a obedecer ele, a ser dependente do homem que lhe causava medo e nojo.
            Mesmo com tão pouca idade, Bruna sempre soube julgar as pessoas pelos seus atos. E Carlos merecia tal julgamento. Chegava do trabalho totalmente bêbado, torrava o dinheiro que muitas vezes era do aluguel em bebida, forçava sexo com a mãe de Bruna – com ela por perto, quase sempre – e, o que mais fazia chorar de raiva, Carlos espancava sua mãe. Sua querida e delicada mãe. A mão dele descia e cortava o ar, batendo com força no rosto da mulher, virando-a e fazendo-a cair sobre os joelhos.
            
            Era com ele que Bruna fora obrigada a morar. Um homem que ela nunca respeitou ou sequer tentou obedecer durante os anos; um homem que lhe dava nojo; um homem que em nada fazia jus à memória de sua mãe; um homem que não mereceu a vida que teve... até agora.
            
           Conforme crescia, Bruna objetivou que sua vida seria fazer a vida de Carlos um inferno. Sempre com a desculpa de estar frágil e passando por momentos difíceis e depois amparada pela rebeldia comum da adolescência, a verdade era que Bruna estava mais do que consciente de tudo o que fazia. Da vez em que batera e deixara o carro dele explodir quando tinha 16 anos, da primeira festa com direito a furtos e objetos quebrados aos 15 e também durante todos os três anos em que passara roubando o dinheiro da carteira do padrasto, fazendo-o crer que tinha gastado o dinheiro com bebida.
            Mas com uma coisa Bruna não contava...
           
            Ela tinha completado dezoito anos há menos de dois meses. Era uma noite comum, como as outras. Ela tinha ficado deitada no sofá, de pernas pro ar, vendo televisão durante o dia todo. A louça estava na pia desde sabe lá quando. O cheiro de mofo vindo das quentinhas de papelão em cima da pia chegava à sala, mas não a incomodavam mais. Depois de tomar um banho quente, Bruna se vestiu e foi dormir.

Mais tarde naquele mesmo dia, Carlos chegara bêbado em casa e ficara enraivecido ao encontrar a casa no estado deplorável de arrumação. Dirigiu-se aos tropeços para o quarto de Bruna, pronto para lhe passar um sermão. Parou de imediato na porta. A verdade era que Carlos sempre observava sua enteada e percebera como ela havia crescido. Por diversas noites se pegou imaginando seu corpo curvilíneo e virgem, mas afastava tais pensamentos insanos. Mas Bruna nunca aprendera a fechar a porta do quarto e, dessa vez, Carlos não estava em suas faculdades mentais.
            A mão do homem deslizou pela coxa desnuda da menina, arrepiando-a os pelos da perna e do braço. Ele deitou-se sobre a menina, que acordara com o peso repentino em cima de si. Antes que pudesse gritar, no entanto, o homem a silenciou pressionando a mão de encontro à sua boca.
            
           Com a outra mão ele descera a calcinha dela e começara a dedilhar seu sexo, explorando um lugar que ninguém havia estado antes. Bruna lutava e se debatia, soltando gritos abafados pela mão firme do padrasto. Carlos segurou suas mãos logo depois de amarrar a fronha do travesseiro em volta da boca dela. Livrou-se da calça e arriou a cueca. Cuspiu na cabeça de seu membro que latejava de tesão e jogou seu corpo sobre a menina e empurrou-lhe o membro sexo à dentro. Para Bruna aquilo era um pesadelo. Para Carlos, um sonho.
           
            Bruna gritara. Um grito sofrido, abafado e choroso. As lágrimas escorriam pela sua bochecha e o ódio crescia, ficando maior do que já era. Maior do que foi. E ela de repente percebeu que não poderia fazer nada... naquele momento.
            Carlos continuou seus movimentos de vai e vem enquanto a menina se postara imóvel. Sem gritar, sem se debater. Apenas chorava e gemia de dor. O cheiro de sexo preenchia o ambiente. E assim permaneceu por mais algum tempo. Bruna chorava e encarava o rosto do homem. Um rosto que ela jamais esqueceria. Um rosto que demonstrava prazer. Enquanto ela chorava e sentia nojo, ele sentia prazer. Quando gozou, Carlos tirou-se de dentro dela e foi para o banheiro como se nada tivesse acontecido. Deixou a garota ali, com gozo e sangue escorrendo pelo lençol de sua cama.
            
             Bruna sentia-se imunda. Assim que o ouviu sair do banheiro, livrou-se da amordaça e se trancou lá dentro. Permaneceu por horas. Se esfregava e chorava de baixo da água quente; saiu do banheiro e se trancou no seu quarto. Deitou no tapete e se enroscou com a toalha cobrindo seu corpo. Chorou a noite toda.
            Nos dias seguintes, Carlos tratava a menina como se nada tivesse acontecido. E de fato, pra ele, nada tinha ocorrido. Ele não se lembrava de absolutamente nada daquela noite. Mas Bruna lembrava. E ela não conseguiria esquecer. Do rosto que denunciava o prazer. Dos olhos negros que fitaram o seu por alguns segundos. Olhos que a perseguiram em sonhos e durante todas as noites...
            
            Quando completou uma semana, Bruna tinha um plano. Carlos adormeceu no sofá, com a TV ligada. Era a hora perfeita. Foi em direção ao seu quarto, pegou a fronha suja que estava jogada no canto desde o fatídico dia e voltou à sala, pondo-se de pé frente ao porco sonolento do qual sentia repulsa. Admirou a cena por um segundo e sorriu. Finalmente ela se veria livre dele.
            
            Aproveitou-se da posição dele e passou a fronha pela sua boca aberta, amarrando-a firme, impedindo-o de fechar a boca completamente. Carlos remexeu-se, mas não acordou. Bruna foi até a garagem, pegou o pedaço de corda que ela preparara no dia anterior e, voltando à sala, pegou a garrafa de refrigerante de cima do balcão.
            Amarrou as mãos de Carlos, unindo-as uma em cima da outra. Depois de dar um último nó, abriu a garrafa de refrigerante e despejou em cima de Carlos. O homem despertou confuso e alerta. Percebera seu estado de impotência e começou a gritar. Bruna não ligava pros seus gritos. Quando Carlos tentou se levantar do sofá, Bruna empurrou-o de volta. Carlos olhava sem entender para suas mãos atadas e depois para Bruna, que não desviava o olhar. Ela queria que ele reparasse seus olhos. Que essa fosse a última coisa da qual ele lembraria depois daquela noite.
            Bruna remexeu no bolso traseiro da calça e tirou uma caixa de fósforos de dentro. Abriu a caixa e riscou um palito. Acontece que a garrafa não era de refrigerante...

            
            Quando o fósforo caiu no colo de Carlos, Bruna se afastou. O fogo abraçou o corpo do homem e os olhos da menina perderam o foco na mancha alaranjada que era seu padrasto em chamas no meio da sala. Carlos se debatia e gritava, mas Bruna não se importava com isso. Deu uma última olhada para o homem que agonizava em chamas e desespero, saiu da casa e foi em direção ao carro parado na calçada. Olhou uma ultima vez para a casa. Percebeu que o fogo havia se alastrado e agora consumia toda a sala. O pesadelo tinha acabado. Um sorriso apareceu em seu rosto. E, enquanto dava partida no carro, sentia-se limpa, finalmente."

- Jackson Jacques